Mostra do imaginário popular
São flandeiros, uma arte quase em extinção na região do Cariri, e os xilógrafos de Juazeiro que ganham espaço
Juazeiro do Norte. A arte pura do Cariri em exposição. Com o título “Genuinamente arte, arte bruta do Cariri”, estão expostos diversos trabalhos de artistas da região no Centro Cultural Banco do Nordeste, neste município. São artistas pouco divulgados, mas que agora têm um olhar lançado sobre a arte determinantemente de uma região que envolve um contexto amplo de criatividade artística. Durante a exposição, a homenagem especial é voltada para o príncipe Ribamar da Beira Fresca. Um visionário, considerado louco, ou um louco visionário. José Gomes Menezes se intitulou dessa maneira, poético como ele. Já teve sua forma de ver o mundo descrita pelo ator juazeirense, José Wilker.
O professor Titus Riedl, um dos organizadores da exposição, diz que a meta é levar ao público, até abril, um trabalho de artistas que estão fora da rota do mercado, em que outros artistas da região já estão inseridos. São flandeiros, uma arte quase em extinção na região, e os xilógrafos de Juazeiro que ganham espaço. Um espaço de anjos, floristas, escultores. O Mateu, um personagem do reisado, é uma presença importante e imponente diante da alegria que transmite.
Uma festa tradicional em Juazeiro e que ainda sobrevive ao tempo. Nas áreas das periferias da cidade há quem resgate a tradição de render a fé a São Lázaro, protetor dos cães. São servidas refeições, num grande festejo, a esses animais. Todos se servem num grande banquete preparado especificamente para os mais abandonados. São os vira-latas que têm vez principalmente. Ao meio-dia o almoço é servido, não só para os cães, mas gente também faz parte da comilança.
O personagem de Príncipe apaixonado por Gioconda, de Da Vinci, rodou as ruas de Juazeiro à espera de sua amada, que iria atravessar o Atlântico. Construiu o aeroporto, firmou tratado de paz, com projetos infindáveis, fez nascer das suas imaginações esquizofrênica fábricas de desentortar bananas ou até de fumaça. O homem, de profissão carpinteiro, surtou após a perda da irmã e da mãe. Bem vestido como ele só, o ar solene, e a foto da amada, o noivo prometia a chegada do amor à sua terra. Sempre brincavam com ele, era motivo de risos e chacotas.
De tanto atormentarem e cobrarem a chegada da noiva Gioconda, sempre levada nas mãos, para mostrar ao público a cara de sua futura esposa, o Príncipe Ribamar, sempre altivo, com sua pasta cheia de projetos e diplomas, cartas imaginárias e dinheiro falso, decidiu que ela não viria mais de navio. Uma viagem demorada demais. Seria mesmo de avião.
Ele tinha todos os comprovantes da viagem. Mas, como chegar a Juazeiro sem um aeroporto. Isso não era problema para Ribamar, com roupas cheias de medalhas, guarda-chuva branco, que sempre aparecia de lugar nenhum e partia para nenhum lugar, como bem descreve Wilker, que conheceu pessoalmente o homem insano e poético que percorria as ruas da terra do “Padim” nos anos 50 e 60. Juntou equipe que passou a trabalhar de forma acelerada para o pouso imaginário. E foi no mesmo local onde hoje está construído o Aeroporto Orlando Bezerra de Menezes. Por justiça, diz o ator José Wilker em seu texto, o mais poético e que traduz a personagem de Beira Fresca, o nome do aeroporto deveria ser Príncipe Ribamar da Beira Fresca.
Titus Riedl classifica o Príncipe Ribamar como o personagem mais rico de Juazeiro. Está no esquecimento. O visitante assíduo do Banco do Brasil chegou até a ser homenageado com nome de rua. “Não deixou marcas e nem é lembrado, por isso a homenagem poética da exposição”, diz ele.
O trabalho pode ser uma forma de também chamar a atenção para o abandono social de pessoas que sofrem de algum problema mental, que não têm um acompanhamento.
Elizângela Santos
Repórter